A terra preta da Amazônia, também conhecida como “ouro negro”. Este solo extremamente fértil, encontrado em manchas isoladas pela bacia amazônica, é rico em matéria orgânica e nutrientes essenciais para a agricultura, mas não se formou naturalmente. É uma herança do trabalho de antigos povos que habitavam a região.
A história da terra preta remonta a, no mínimo, 5.000 anos, com um pico de produção há cerca de 2.000 anos, refletindo a ascensão e queda de civilizações. A chegada dos europeus no século XV marcou um declínio significativo na produção deste solo fértil.
Em janeiro de 2024, cientistas anunciaram a redescoberta de uma “cidade-jardim” de 2.000 anos escondida sob a folhagem no vale de Upano, na parte Equatoriana da floresta Amazônica. Essa descoberta levantou a possibilidade de existirem muitos outros assentamentos antigos ocultos na Amazônia, sendo a terra preta uma chave para entender como essas comunidades se sustentavam. Tais pesquisas mostraram que a terra preta é encontrada em todo território Amazônico, provando assim que a floresta foi um dia habitada em sua totalidade.
Estudos recentes revelaram que árvores domesticadas por humanos são cinco vezes mais prevalentes na Amazônia do que as de origem natural, especialmente perto de antigos assentamentos. Embora muitas comunidades tenham desaparecido devido à colonização europeia e às doenças que vieram com ela, suas práticas agrícolas ainda influenciam a floresta.
Composição
A terra preta é uma mistura de materiais inorgânicos como cinzas e argila, além de resíduos orgânicos, como restos de alimentos e esterco. Esse solo fascinante continua a enriquecer a floresta e a suportar a agricultura indígena até hoje. Sua presença é um indicativo do extenso impacto humano na floresta amazônica, desmentindo a ideia de que é uma região intocada.
A produção de terra preta, que varia conforme os ingredientes usados, mostra a adaptação e inovação dos antigos habitantes da Amazônia. Este solo é um poderoso sumidouro de carbono, contendo até 7,5 vezes mais carbono do que o solo ao redor, ajudando a mitigar as mudanças climáticas. Curiosamente, a terra preta deixada pelos antigos povos da Amazônia não tem uma composição uniforme. Ela varia significativamente conforme os ingredientes específicos utilizados em cada local. Mas o mecanismo básico de criação do solo e seu enriquecimento parece ser similar.
A terra preta da Amazônia não é apenas extremamente rica em nutrientes, mas também funciona como um poderoso sequestrador de carbono. Ela contém até 7,5 vezes mais carbono do que o solo circundante.
À medida que a terra preta se acumula, o carbono fica preso no subsolo, onde permanece estável por centenas de anos, retardando sua liberação na atmosfera.
Ainda não sabemos exatamente por que o carbono da terra preta se comporta dessa maneira. Os cientistas suspeitam que isso esteja relacionado ao “carvão preto”, também conhecido como “biochar” ou biocarvão.
Esse biocarvão é produzido a partir de material orgânico transformado em carbono quase puro sob altas temperaturas, com baixo nível de oxigênio. O processo libera menos dióxido de carbono do que a produção de carvão e gera um produto fino e quebradiço, encontrado na terra preta em toda a região amazônica. Além de reter o carbono, “o biocarvão melhora a estrutura, aeração, capacidade de retenção de água e de nutrientes”, o que pode sustentar o crescimento saudável das plantas.
Tal técnica precisou de tempo, para desenvolver as condições necessárias para que a terra preta se tornasse tão fértil a ponto de cobrir o vasto território da América do Sul.
Quem desenvolveu tal conhecimento e tecnologia? Sem dúvida, civilizações evoluídas habitaram a floresta Amazônica.
Amazônia foi plantada?
A floresta amazônica é composta por árvores cultivadas há milhares de anos, e as florestas consideradas “intocadas” e remotas são, na verdade, resultado dessas plantações pré-colombianas, conforme revelou um estudo divulgado em 2017.
Nigel Pitman, do Museu de Chicago, Estados Unidos, e coautor do estudo, afirma que “algumas das espécies de árvores que hoje são abundantes na floresta amazônica, como o cacau, o açaí e a castanha do Brasil, provavelmente são comuns porque foram plantadas por povos que habitavam a região antes da chegada dos colonizadores europeus”. Os resultados foram obtidos ao combinar dados de mais de 1.000 pesquisas florestais com um mapa contendo 3.000 locais arqueológicos em toda a Amazônia.
Comparando a composição florestal em diferentes distâncias dos sítios arqueológicos, a análise revelou que os povos pré-colombianos tiveram um impacto significativo na biodiversidade da Amazônia. O estudo focou em 85 espécies de árvores domesticadas pelos povos amazônicos nos últimos milênios, seja para alimentação, abrigo ou outros usos.
Os pesquisadores descobriram que essas espécies eram cinco vezes mais comuns nas regiões mais altas da bacia amazônica em comparação com as não domesticadas. Em alguns locais, as espécies domesticadas eram mais prevalentes e diversificadas perto dos centros arqueológicos. “Mesmo em algumas florestas muito remotas e antigas, que se acreditava serem intocadas até hoje”, comentou Pitman.
Essa descoberta promete intensificar o debate entre cientistas sobre a influência dos milhares de anos de presença humana na Amazônia nos padrões atuais de biodiversidade. O vasto tamanho das florestas havia dificultado a investigação arqueológica, dando a impressão de ser uma paisagem virgem. No entanto, muitos sítios arqueológicos foram descobertos nos últimos anos. A pesquisa envolveu centenas de ecologistas e cientistas sociais de todo o mundo, liderados por Carolina Levis, especialista da Universidade de Wageningen, na Holanda.